Reza o senso comum que “entre quatro paredes, vale tudo”. Mas, para um
grupo de pessoas, “tudo” continua valendo fora das quatro paredes. Para
os adeptos do “dogging”, aliás, a graça do sexo está justamente em fazer
a atividade com desconhecidos dentro de um carro estacionado em local
público.
Escrever esta matéria exigiu que eu me cadastrasse em redes sociais de
sexo e entrasse em grupos de Facebook que reúnem os participantes.
Bastou uma postagem na rede D4 com o texto “procuro praticantes de
dogging em BH. Não faço distinção de sexo nem orientação sexual” para
choverem respostas na minha caixa de entrada. Foi assim que aprendi o
bê-a-bá dessa prática.
“Para você entender melhor, é sexo consentido em um ato público.
Mistura o voyeurismo e o exibicionismo, e tem como base o prazer do sexo
alcançado com mais intensidade pelo fato de desconhecidos estarem
olhando tudo de muito perto”, explicou o usuário B.* Ele, que afirma já
ter participado várias vezes, contou experiências – na tentativa de me
convencer a ir a um encontro. “As pessoas ficam ao seu redor, podendo ou
não olhar o ato. Já vi casais assistindo e, depois, pedindo para
participar de um ‘ménage’. Foi muito bacana”, disse.
Flagrante. A prática
envolve uma dose de perigo, pois os participantes podem ser
surpreendidos pela polícia. O usuário J.* deu a dica de como não ser
pego no ato e, ao mesmo tempo, garantir a diversão. “Nunca deu nada
(errado) porque procuro um lugar mais reservado, porém com pessoas, para
dar aquele tesão com as pessoas vendo. Fiz no carro uma vez com pessoas
vendo pelo vidro e, depois, fiz fora do carro”, conta.
A “modalidade” surgiu na Inglaterra na
década de 1970, mas se espalhou pelo mundo. Em Belo Horizonte, os
“doggers” se encontram na praça do Papa e na Pampulha, próximo ao Parque
Ecológico. Os encontros são marcados nas próprias páginas na internet,
ou pelo WhatsApp.
Análise. Para o doutor em
psicopatologia e psicanálise Paulo Roberto Ceccareli, o “dogging” é um
reflexo da repressão social sobre o sexo. “A sexualidade é um problema
na cultura ocidental. Quanto mais você reprime a sexualidade, mais as
fantasias estarão presentes”, comenta.
Ele também afirma que não há como explicar o
que está por trás de uma prática sexual como essa – nem de todas as
demais. “Certamente, é um exibicionismo. Mas a sexualidade é o grande
enigma do ser humano. O que me atrai em alguém é um fator inconsciente”.
Ceccareli ressalta a necessidade de pensar
na imposição que a prática apresenta. “A única coisa que pode ser
considerada perversão é impor a uma pessoa algo que ela não queira.
Nesse sentido, quem está praticando o ‘dogging’ não pode ser considerado
perverso entre si. Mas os praticantes podem estar impondo às outras
pessoas uma coisa que eles não querem ver. E, desse ponto de vista, o
‘dogging’ pode ser considerado uma perversão”, alerta.
* Nomes suprimidos para preservar a identidade dos entrevistados.
Regras
Para não expor os participantes a situações indesejadas, os
praticantes de dogging desenvolveram sinais para comunicar suas vontades.
Luz interna acesa. Outras pessoas são bem-vindas para assistir ao casal que está fazendo sexo.
Janela aberta. É um convite para que quem está de fora interaja com quem está dentro do carro. Aí vale passar a mão e masturbar o casal.
Porta aberta. Quer dizer que outras pessoas estão convidadas a participar do ato sexual em si.

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